quarta-feira, 5 de março de 2014

Ainda temos este rio para atravessar.

O Buda entrou, pagou, passou, sentou do meu lado e disse:
- Você precisa parar de perseguir os pensamentos.
- Ahm? - Respondi.
- Não e isso que você estava fazendo ai?
- E isso que eu tenho feito a minha vida inteira...
Quem e esse maluco? - me pergunto - e porque ele entra no 341, essa hora da noite, quando só tem engravatados seguindo o protocolo: Casa-Trabalho / Trabalho-Casa. E mete essa de "para de se apegar a seus pensamentos"? Olhe pro lado porra! Todo mundo vestido de cinza, olhando pro celular, plugado, construindo uma vida virtual porque e a única coisa que ainda da tempo de fazer, e isso porque o transito ajuda. Quem criou essa merda de terninho feminino? Que filha da puta de mal gosto.
- Já se perdeu de novo nesse mar de pensamentos, meu caro? - Por um instante eu me perdia novamente num turbilhão de pensamentos sem sentidos, ate que aquele homem novamente me chama a consciência.
- É... Acho que já sou um viciado nisso... Gosto muito dos meus pensamentos... Sabe? Acho-os inteligentes e ácidos... É vicio...
- Inteligentes e ácidos, sim? - Ele riu. - Tenha certeza é um vicio mesmo. Veja, o celular, o tablet, a TV, são todos mecanismos para criar essa pandemia, instrumentos que criam essa avalanche de pensamentos, ate que você se perca e não consiga mais saber onde tudo isso começou.
- Interessante - Respondi. Nessas horas você pensa: "porque a bateria do ipod dura tão pouco?"
Após uma breve pausa.
- Dessa forma, cada ser, seus corações. Suas mentes, se preferir, se distanciam tanto que cada qual não pode mais compreender o outro, e ai sim, acabam por se sentirem "inteligentes e ácidos". - Terminou rindo.
Touché. Esse fdp acabava de me dar uma bela gastada.
- Ok. ok. Mas o que você propõe? - Nessa sociedade de niilistas iconoclastas, todo mundo sabe criticar no vazio. Então a melhor arma que temos é pedir por uma proposta, coisa que ninguém tem. Quando tem, nao passa de um grupo de discussões no facebook, uma punheta coletiva, que chamam de "instrumentos de formação de base."
- Minha proposta? Apenas pare de pensar.
- É. Foi o que eu imaginei... Nada a oferecer.
- Como não? Respire e deixe esse mar se transformar em um rio, deixe passar. Afinal, você mesmo se reconhece como um viciado, apenas pare de usar a droga.
- Não é uma droga, são pensamentos, são inerentes ao homem.
- Não. Na realidade é a vida. E a vida é uma forte alucinógeno.
- Ahm? - Seria a segunda vez que faria essa expressão aqui.
- Como eu posso te explicar isso melhor?  Hmm... A vida não existe. Comecemos assim. Não existe. É uma ilusão, nada disso existe, você criou.
- Perfeito, até entendo alguns conceitos, e tal, mas falta praticidade...
- É simples, abra os olhos, experimente!
- ...Falta praticidade, digo: ta ok a vida e uma ilusão. Mas e ai? O que a gente faz com isso? Sou fruto dela.
- Nada. Não fazemos nada, ate porque qualquer coisa que você fizer, não passara de uma ilusão.
Depois dessa, só faltava me oferecer uma pulseirinha... A pulseirinha da sobriedade consciencial. Tipo a pulseirinha do equilíbrio. Tive que retrucar:
- Sabe porque estão todos nesse ônibus teclando em seus celulares, plugados numa vida virtual? Porque existem pessoas como você. Pregando um monte de baboseira da era de aquários, quando na realidade seria muito mais efetivo, pratico, e simples dizer: "Plante, e coma o que plantou. Ame alguém, tenha filhos, e tente assistir o sol nascer e se por de vez em quando." Sabe? Simples...
- "Ônibus" ? Quem disse que existe um ônibus? - Sorriu novamente.
- Cacete.. Bom.. Eu vou saltar, meu ponto esta próximo, salto agora e vou pensando no que você disse. A vida é um alucinógeno, certo? Vou pensando nisso...
- Exato, e o que eu tenho dito desde o começo! Mas não vai ser pensando que você vai desembaraçar isso, pelo contrario. Mas façamos uma coisa: vem comigo, que eu te mostro o que estou falando.
- Sinto muito, não da. Já esta um pouco tarde, e meu dia foi cheio. Mas obrigado pelo convite. Boa noite.
- Sim senhor, Alexandre.
- Ahm? - Terceira vez, se tiver alguém contando.. - Como sabe meu nome? - Franzia a testa.
- Eu te conheço. Você vai saltar, e durante o primeiro quarteirão, ficara repetindo para si: "que cara maluco". No segundo, vai surgir uma vozinha: "E se ele tivesse razão?" Vai demorar um tempo repetindo para si um monte de coisas. Afinal, que tipo de maluco pega o ônibus mais cinza da cidade as 22:50, para falar sobre O Caminho?
Mas eu sei. Você sabe. Antes que possa colocar a chave na fechadura, o arrependimento estará lhe corroendo, entrará em casa e se perguntará se essa vida vale a pena ser vivida sem nenhum exame. Opa, olha aí o seu ponto.
- Eu vou saltar no próximo, pensando melhor, vou passar na padaria antes...
- Aham. Sente-se.
Sentei.
- Vamo la, você tem mais um ponto para me convencer...
- Não, deixe-me colocar as coisas claras aqui. Você tem mais um ponto para tomar coragem. Está em suas mãos.

Eu não preciso dizer.
Quem me conhece sabe que eu não iria mais saltar. Alguns talvez atribuam isso a minha total falta de entusiasmo com essa vida acinzentada. Outros, a minha falta de foco na vida. Meus pais, quem sabe diriam: "Porra! porque você não pode ser igual as suas irmãs?".
Ahhh.
Todos vocês tem suas razoes, me desculpem por isso. Mas apesar de todos esses motivos eu gostaria que vocês tivessem um pouco de consideração pela coragem que tive que ter para tomar essa decisão.
- Vamos la...
- Ah rá! E O que há demais? Afinal a vida não tem como piorar, não é mesmo?
- Ahm? - Quarta, e contando... - Pera ai! isso é alguma uma brincadeira?
- Ahh por favor, desculpe-me, era só para descontrair.
- Descontrair? Não descontraiu porra nenhuma! Agora eu me sinto uma vaca indo pro abate.
- Ah, por favor, me perdoe. É que sou da filosofia que diz que é melhor aprender sorrindo, do que chorando. Esqueça isso. Não importa mais... Só tem uma coisa, a partir de agora, chega de conversa até chegar la. Enquanto isso, feche os olhos, tente não pensar em nada.

E melhor aprender sorrindo do que chorando? Na verdade essa era a minha filosofia de vida e nada poderia me deixar mais confortável que isto.
{1}Fazia um tempo, não é? que eu não tomava uma decisão, tao zuada, como essa.
{2}Onze e meia! Ainda da tempo de saltar, eu sei... Mas ele tem razão.
{3}Eu já tinha entrado nos trilhos, vinha cumprindo com as minhas obrigações...
{2}Amanha tenho aula inclusive.
{1}Porra! olha minha estante! Cheia de livro de finanças! quer mais lucidez que isso?
{3}Porque descarrilhar agora? Quase la? dentro de uma cabine corporativa jogando dados em Excel...
{2}Eu só continuo porque não tem como continuar assim mesmo, ele tem razão.

 - Ponto, pronto.

Chegando ao local, precisamos andar por mais dez minutos em uma rua pouco iluminada, até chegarmos num grande portão de madeira que fechava a entrada de uma mata. Por essa razão desviamos da estrada e conseguimos entrar pela primeira abertura entre as árvores. Levados mais uns 10 minutos o clima todo já havia mudado, não poderia mais dizer que estava no meio de uma cidade, nem mesmo poderia dizer que estava no meio de uma floresta, afinal, de noite não se enxerga nada, apenas as copas das árvores porque cobriam um céu luminoso, o que via não era as copas propriamente, mas o contorno da luz por elas.
Um forte barulho de água fluindo era audível, estávamos andando paralelo a um rio que descia a minha direita até que um clarão se formou e ele disse:
- Chegamos. Desceremos ate as margens. Tome cuidado com as pedras.
Não era um rio qualquer. Não era um rio.
- Essa e a hora que eu devo te dizer algumas coisas. - Quase não o escutava, era difícil disputar com o barulho daquelas águas. - Tome o seu tempo, mas o proposito de tudo que fizemos até aqui, é chegar na outra margem do rio.
- Ahm?
- O que viemos buscar está na outra margem do rio. Preciso que você atravesse. Mas não tenha pressa, tome seu tempo.
- Você ta brincando? se e algum tipo de brincadeira não entendo..
- Não. Só que é melhor tirar os sapatos e o que mais for pesar. Nessas águas menos é mais.
Eu gostaria de te explicar, mas eu nunca tinha visto um rio assim, sabe aquele ditado chines que diz que a água faz o caminho mais fácil? Contornando os obstáculos? Nada disso se tratava àquele rio. Ele simplesmente escavou na terra sua passagem, furou a mata, arrombou as pedras, e aliciou o vento para correr como ele.
- Não tem a menor possibilidade de atravessarmos esse rio a nado. Vamos subir, que provavelmente encontraremos uma parte em que ele estreite.
Certamente eu estava louco, o que devia ter dito era: "valeu, valeu, mas agora eu vou pra casa."
- Não. Esse é o Caminho. Tome seu tempo. Mas precisa ser feito, não há como adiar isto. Já esta sendo feito. Estamos somente a espera, tome coragem e deixe fluir.
Essa palavras eu nunca irei esquecer, grande parte eu já até esqueci, mas quando ele disse "Já esta sendo feito" eu pude perceber que por alguma razão já estava mesmo, porque eu não voltaria.
Era como se a minha vida inteira eu estivesse me preparando para um dia estar exatamente em cima daquela pedra olhando o rio, apenas esperando minha coragem chegar, ou qualquer empurrão caso ela não viesse.
Fui pego por um enjoo, fiquei completamente fraco e precisei agachar.

- Acho que vou vomitar.
- Não hesite, faz parte do processo.

Começou. Eu regurgitava, mas pouco havia a sair, a cada vez que vinha, era mais forte, minha temperatura subia e eu suava como se tivesse em um forno. Minutos se passaram até que recuperasse minhas forças.

- Pronto, eu to bem. Mas não da para fazer isso, olhe a forca desse rio! se cairmos nessas águas já era, seremos levados com ele, com sorte não morreremos batendo a cabeça em alguma pedra.
- Seremos levados, sim, seremos levados. E não será fácil, não, não será fácil, mas lembre-se: A última coisa que você quer neste Rio, é que este Rio seja fácil. A ultima coisa que você quer que aconteça, é que por alguma sorte ou razão, você seja levado pela correnteza ate as margens do outro lado. Que infortúnio seria de la, sentar-se olhando tudo que foi atravessado sem ter sido um desafio, sem que você tenha aquele respeito próprio de saber que passou por inúmeras correntezas dais quais pensou que nunca poderia ter vencido, imagine só, lembrar de tudo sorrindo, sem saber se atravessando de novo conseguiria, tamanha foi a força. Ah meu caro. A última coisa que queremos é que este Rio seja fácil, que seja por um golpe de sorte ou acaso, sem ter se perdido e se encontrado, sem ter afundado e emergido, ser guiado e guiar o caminho. Então levante-se. Ainda temos este rio para atravessar!
(continua...)



Não era preciso dizer mais nada, A última coisa que quis foi que minha vida fosse fácil, eu já estava nas águas nesse momento. Não era um rio, não era. Mas tinha águas congelantes, logo que cai senti que minha corrente sanguínea congelava, meus batimentos acelerados urravam sangue, meu estomago gelado como se estivesse em queda livre, minhas extremidades cada vez mais enrijeciam. Eu estava afundando e pouco desejava fazer algo a respeito. La bem no fundo quase não dava para notar que na superfície tudo era bem mais violento. Quando abri os olhos, lá no fundo, lá estava ele: O Yin e o Yang, simplesmente, não me pergunte o porque, ainda tenho que pensar bastante sobre isso, só que um detalhe, piscava vermelho e azul, também não me pergunte o porque, mas la estava ele, vermelho e azul. A medida em que fui tomando consciência, não era apenas isto, mas todos os símbolos humanos criados estavam a piscar e brilhar num misto de cores. Muitos eu sabia que estavam la, mas não enxergava porque não estavam brilhando, mas aqueles que acendiam tinham cores surpreendentes.

Eu não via mais ninguém, aonde estava meu mestre? não sabia, mas sentia que não estava sozinho, quase ria de tanto que sentia a presença de alguém do meu lado, ou eu estava rindo? é uma sensação engraçada... Neste momento já devia ter ficado tempo demais debaixo d`água e quando percebi estava congelado, um bloco de gelo me cercava, muitas vezes vinha um desespero, como sairei daqui? mas aquilo ou aquele que sentia ao meu lado, de alguma forma cuidava de mim, como cuidasse de uma criança com febre e me dizia: "Vai passar... Vai passar, tudo é cura."

Passei um inverno rigoroso lá em baixo, imóvel pelo gelo que me cercava pude tomar consciência de todo o meu corpo, de mim, até que tive profundas epifanias. Não estava sendo o que devia.
Todos nós temos um caminho a seguir, mas alguns precisam abrir seu caminho, o meu estava fechado, não vi e perdi a trilha, sorte minha que eu nunca quis que fosse fácil. Naquele momento o gelo rachou. Pude notar que meu coração o quebrava como uma britadeira, o inverno estava terminando, a lição tinha sido aprendida, não há gelo que a primavera não derreta.

No momento em que pude, segui para superfície, águas bravas, olhei em volta e não havia qualquer direção que pudesse seguir para continuar o caminho, era água, águas bravas para todos os lados. Mas antes que eu pudesse me considerar a deriva passou um barco que seguia lentamente em uma linha reta, não era um barco pequeno, mas era completamente feito de madeira e seu casco repleto de escadas, segurei em uma e escalei até o convés.

No porão do navio encontrei um grande numero de pessoas sincronizadas com seus remos impulsionando o navio para frente, notei porem que atrás de um homem Hindu havia um remo ocioso, fui para la fazer a única coisa que fazia sentido.

- Olha ai, voltou para tomar um ar?
- Nos conhecemos? - Perguntei.
- Claro! já fizemos esta viagem inúmeras vezes. Você é o capitão do navio!
- Sou? bom, então estou me destituindo do cargo, agora nomeio a ti. Você nos guiara neste rio.

Era o mais sensato a se fazer, então peguei o remo atrás dele e sem mais nenhum dialogo seguimos viagem. Porque todo movimento repetitivo é um movimento espiralado para dentro de si? Percebi que em tempos passados, tendo sido nomeado capitão do navio provavelmente aceitaria o cargo e improvisaria algo, mas não desta vez, quem eu queria enganar? talvez essa fosse a primeira vez, admitidamente perdido, não iria me enganar que coordenaria barco algum.

Lembra quando você era criança e sonhava que sabia voar? Foi o sonho mais recorrente da minha infância, lembro que quando dormia tinha a plena sensação que estava acordando ali, e la acessava dons que acordado esquecia. Por alguma razão este barco me lembrava isto.

- Um dia somos o guia, outro dia somos guiado. - Disse o guro Hindu.

Mais tarde no convés, olhando para água via-se todos aqueles símbolos que antes tinha visto ao meu redor na água brilhando, continuavam la, brilhando, era um rio de símbolos que piscavam, um incompreensível cardume de informações humanas.

Aos poucos fui lembrando, quem sabe estava me recuperando por ter ficado tanto tempo congelado, lembrava sim do homem Hindu. Era ele que tinha sentado ao meu lado no ônibus...
Ônibus? Percebo agora, não havia ônibus algum, tinha sido sempre esse Rio.

- Aonde esta o capitão? - Gritei, mas sem intenção de incomodar ninguém.
- Você viu o capitão deste barco? - perguntei ao primeiro que passava.
- O Capitão? O barco esta a deriva! O capitão enlouqueceu e escreveu um memorando que dizia: "Estivemos aqui. Mas agora é Tempo de abandonar o navio.".


Esse era eu. Tipico das minha atitudes, quando a maré ficou forte abandonei e tentei convencer a todos que isto era o mais sensato a se fazer.

- Não estava errado. Fez o seu caminho, pulou e agora esta aqui de novo. Talvez devesse tomar o rumo das coisas novamente. - Disse o Hindu que eu procurava.
- Estava te procurando, aonde estamos? e porque esta tudo assim?
- Não se preocupe com a geometria, é bastante confuso entender isto através da matemática. Na verdade não estamos, por isso tudo esta tao cru assim.
- Quero saber para onde estamos indo.
- Para o outro lado. O que escoa neste rio é o tempo. E o tempo é inexorável. Passa para mim, como passa para você, e não há como escapar dele. O barco é um filtro, e o resultado de todos interligados em um propósito só, anda devagar pois só funciona quando todos dão sua remada para frente, você só anda quando todos andam. Nadar no rio é a forma mais rápida, mas é bom de vez em quando voltar ao barco para tomar um pouco de ar, o Tempo exige o rio, o corpo exige o barco para descanso.
A medida que cada um toma consciência do barco, ele anda mais rápido, pois a Forma não pode existir, porque não é autoconsciente. A Forma precisa de um ser consciente para dar existência a ela própria. Este é o nosso trabalho la em baixo no Rio. Tonar autoconsciente.

As coisas agora começavam a fazer sentido, sempre estive no barco, não há nada além do Rio e do Barco, talvez fosse isso o que ele disse sentado ao meu lado. Tudo aquilo era uma ilusão, mas e o Barco? O Barco estava afundando, aos poucos montava o quebra-cabeca, e meu dever era de novo, pular do barco. Fui até a proa, olhei para baixo e senhores, não era um rio! Não era um rio! Olhando daqui de cima via apenas duas mãos. Não era um rio, sei que pode parecer que estou te fazendo perder seu tempo. Mas não era um rio em que navegávamos, tao pouco posso descrever o que era, mas estava cheio dos símbolos humanos. "Respira fundo, e pula" lembrei e pulei.
Daqui de baixo, vejo duas mãos, mas além. Uma nova percepção, de uma nova realidade, estava ali no Rio mais bravo de nossas vidas, que nunca foi um rio, mas a transição, uma barreira de consciência. Era o que estava a minha frente, um céu de estrelas, e que eu olhava de cima para baixo, via as infinitas possibilidades, mas todos os caminhos levavam ao mesmo cume.


Via a criança feliz, que corria entre as ondas, entre nós, entre os símbolos e os peixes.

Via o labirinto das infinitas possibilidades.

O adulto centrado. O 5 da terra plena, o 7 do homem pleno, o 9 do céu pleno, mas era o 4 lá em baixo enquanto ainda estava congelado, que segurava toda esta água, nada melhor que o quadrado e seus ângulos retos para vedar este rio.

O sagrado feminino dançava a minha frente, como se não houvesse peso, como se estivesse flutuando no chão. Como ela faz isso? Poderia ficar o dia todo aqui sentado assistindo ela dançar. Pediria seu coração e me incumbiria de mante-lo batendo o resto de sua vida. Mas sou muito desritmado para isso, precisaríamos de um marca-passo para dar certo.

Um caracol passando lentamente...

Eu devo confessar que quando congelei no fundo do rio, olhei para dentro e descobri uma luz que ate então não sabia existir. Foram 3 longos anos, e eu nem sabia se dessa vez sairia dessa, mas não ha gelo que a primavera não derreta. Nessa luz residiam todas as cores, toda luminosidade. A sombra também, o que não brilhava era o reflexo do que estava apagado em mim. Entendia melhor agora aquele rio. Tudo o que brilha é o reflexo de nossa própria luz. Era preciso iluminar a caverna, sem desejar resultados disso. Cinco mil anos de filosofias vinham a tona, nunca é fácil nadar em uma correnteza assim.

Mas logo uma onda me jogou para lateral, bati a cabeça e acordei. Estava dormindo no 341 desde o inicio, a correnteza era o movimento regido por um motorista apressado, a água gelada o vento frio da descida da serra, por sorte eu tinha acordado exatamente no meu ponto, levantei rápido, puxei a corda, o ônibus parou e quando a porta abriu pensei:

Eu já devia ter tirado essa flecha mirada para baixo do pescoço e seguido meu caminho a muito tempo. Porque eu demorei tanto?

- Desculpa, ponto errado. - Gritei.

Lembrava exatamente de todo ambiente com que acabava de sonhar, poderia repeti-lo de novo facilmente. Me sentei e pensei alto:
- Se hoje nao der tempo para dormir, será justo, hoje é o ultimo dia de uma rotina que acaba aqui.
- Ahm? -  me questionava a senhora que sentei ao lado.


domingo, 9 de junho de 2013

O relógio já está na metade.

O único ato genuinamente libertador que eu conheço, é vomitar. Liberta e revigora. A morte? pelo contrário.
Morrer é assinar todas as cartas que você nunca escreveu, e em branco, teu nome te prende à elas e as pessoas que nunca as receberam, e que nunca ouviram teu eu te amo.
Papéis pesados, cortei o dedo neles.
Até que aqui, vomitando todos meus sentimentos, digeridos, crus, aminoácidos, eu acho uma boa ideia - amanha, quando me recompor irei abraça-los - e pedir a permissão de dizer que vos amo.
Mas não farei.
Embora preferisse, disfarço.
Será que precisamos tanto dos outros?
E mesmo que não, eu quero, e isso me bastaria.
Mas e quando eu tirar toda a armadura? e descobrirem que nunca fui forte? que descobrirem que preciso de ajuda? ou pior, que nem sempre quando eu caio, eu me levanto, e quando faço é ligeiro, disfarçado, aceno, e quando passa a primeira parede eu agacho e remoo a dor.
A sinfonia continua. Por hora, parece até que meu coração já bate de acordo com a força de meu esôfago pondo tudo para fora. Vem de dentro, dentro de um lugar que nunca vi em livro de anatomia nenhum.
Sinto órgãos que não existem, dores em locais específicos, se o corpo é um microcosmo como os chineses dizem, está tendo um bigbang e um buraco negro ao mesmo tempo dentro de mim.
Tudo está girando. Gira a bile com a saliva, e forma uma pintura no meu chão, coisa que não se vê facilmente num museu de arte. Isso sim é de verdade, vivemos pelo menos 100 dias para termos um dia como este, em que você se sente vivo e sabe que hoje é o ultimo dia de uma rotina que acaba aqui.
Porém se eu falasse aqui, agora, com todo esse ácido corroendo minha garganta que eu não gostaria que isso parasse, estaria mentindo, mas enquanto eu tiver bile e soro para não desidratar vou continuar aguentando para quem sabe amanha acordar herói da minha própria história.
O relógio já está na metade. meio cedo, meio tarde.
Pela janela, vejo um sol nascendo e outro se pondo.
Esse aperto no coração não me deixa dúvidas de que é nele que reside os sentimentos, a ciência diz que tudo isto se passa na mente, mas o dia que estes homens sentirem isso, precisaram rever toda literatura.
Porque a gente quando pode escolher entre uma coroa pra por na cabeça ou uma cura para esta dor, acabamos escolhendo a primeira?
Se eu pudesse escolher uma música para escutar agora, enquanto regurgito minha vida inteira, seria alguma de que eu não conheço o nome, que ouvi uma vez num filme, ou rádio ou foi um sonho? Silêncio!
Agora, olhando por outro lado, quem sabe a morte liberte, depende.
filosofia barata? nem tanto...
Com sono, eu limpo essa sujeira amanha.

2011.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Réquiem para Dorian Gray [originalmente postado: ovitimirp / fev-2010]



Ambev – A empresa do futuro.

Não é por ser época de carnaval, verão, ou de festas de fim de ano. A bebida alcoólica é sem duvida, um dos produtos de mais fácil venda no mundo. A grande ascensão da civilização pode se dizer que é justamente no domínio da técnica de produção alcoólica.[Falta citação] De outra maneira, não acredito que seria possível conseguir suportar o abismo entre o âmago humano e sua recém história de exploração. A civilização egípcia, temos exemplo de uma das maiores que tivemos até a nossa, e tem sua história criada a escravismo e álcool. Hoje a antropologia vê claramente, como num jogo de Xadrez, aonde você quando está de fora tem sua percepção ampliada, que o Álcool era usado como um instrumento de indução social, um anestésico mental, e afrodisíaco. Hoje, porém, consumimos ainda mais álcool, e não percebemos o sistema escravista contemporâneo, não pensamos sobre nossa condição, e continuamos sendo as parideiras do Estado.

A decadência da igreja e a morte de Deus.

Hoje vivemos num ambiente sem quaisquer proibições, qualquer bizarrice pode ser televisionada e vendida, porque hoje a moral vigente, é a moral do gozo. Nada mais é clandestino, precisamos viver na busca constante do prazer, atigir o prazer eterno, e é por isso que estamos alcoolizados a maior parte do tempo. O que fizermos para atingir o gozo é permitido e inquestionavel, embora isso tenha trazido mais sofrimento que prazer.

Ei amigo? Você não precisa se divertir hoje aqui ok? (se vc é da modinha new age pule esta parte)

Podemos ver estes aspectos claramente no retrato da globalização. A popularização de religiões hedonistas é um exemplo. O que lhe é vendido do budismo, é a busca pela paz interior, pela alegria, e serenidade, claramente, o individualismo do seculo XXI é parte da moral do gozo. Para alguns a meditação é a busca do prazer individual, para outros o nirvana está num copo com Coca-cola. A Coca-cola é o ultimato para o superego, como disse Zizek, é o que o individuo que vive na busca pelo eterno prazer tem como seu deus, ou melhor, Buda, deus está morto. A Coca-cola é feita para matar sua sede, mais quanto mais você bebe, mais você sente sede e mais precisa beber, estando numa situação aonde desfruta do constante prazer de estar matando sua sede. Sem nunca alcança-lo.

O Prazer se transformou em dever.

Disseram-nos em algum lugar, que viemos do céu, e que estamos aqui para sermos felizes. Dito isso, observando nosso estado, não é de se espantar como estamos tomando anti-depressivos como água. Essa busca pela felicidade, pelo prazer, pelo gozo pleno da vida está diretamente ligado a esta constante depressão e angustia contemporânea.

Ou ninguém sabe ou ninguém se importa.

Você não deve deixar de se divertir, ter prazeres ou beber, mas saber que lhe é permitido não ter prazer, não se divertir, não beber. Não transformar o prazer em uma obrigação. O prazer como obrigação que é tão cultuado em nossa sociedade pode explicar a ascensão do império da Bebida, a necessidade de estar se divertindo enquanto o resto está caindo aos pedaços e a necessidade de ser enganado pela televisão para levantar cedo todos os dias.

Menos porque a Felicidade veio, e foi embora.

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Edição 2012:
Quinta-feira, 15 de Março de 2012
Constrangedor: AmBev deixa Vale para trás e já é segunda maior empresa da Bolsa
Uma situação inesperada ocorreu na Bolsa: pelos preços de fechamento das ações da AmBev (AMBV4) e Vale (VALE5) ontem, a cervejaria tornou-se a segunda maior empresa em valor de mercado do Brasil deixando a mineradora em terceiro lugar. A AmBev fechou ontem com valor de mercado de quase R$234 bilhões, enquanto a Vale registrou R$220 bilhões. A Petrobras (PETR4) continua com no topo do pódio valendo em torno de R$320 bilhões. A situação é constrangedora para a Vale, uma das maiores empresas do País, contribuinte com grande parte do saldo superavitário da balança comercial do Brasil nos últimos anos. Uma análise superficial pode tentar explicar o motivo: enquanto as ações da AmBev rompem seu topo histórico de preços, os papéis da Vale estão presos em uma faixa de oscilação entre R$36 e R$45 há quase um ano, absorvendo as incertezas da economia mundial.

Fonte: Advfn.com

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Quando entrei no ensino médio, optei pelo curso técnico de meio ambiente, entrei com a mentalidade: "Quero salvar o mundo, quantas arvores preciso plantar?" era simples, eu queria um numero, só tinha 15 anos e achava que era bem por ai, logo ainda naquele ano aprendi que o problema era pior, mas não em sala, aprendi fora dela, como com tudo, foi em discussões com amigos, leituras, filmes, documentários... Aprendi que não era necessário plantar arvores, a natureza faz isso muito melhor do que humanos. Era preciso parar de cortar arvores. Pronto, eu devia ter 16, e agora eu queria caçar cada filha da puta que estava destruindo o mundo que eu queria salvar. Mas ai eu aprendi que o problema era pior, mas não em sala, aprendi fora dela, como já disse uma vez e repito, nunca aprendi nada dentro da caixa de paredes brancas, foi em discussões com amigos, em leituras, filmes, documentários, meditação... Aprendi que o problema não era cortar arvores, o problema era precisar cortar arvores. Era preciso descobrir porque precisavamos viver tanto na contra mão da natureza, enfim, eu tinha 17 anos, e descobri que o sistema econômico exigia que depredacemos tanto o meio ambiente, era preciso mudar de sistema econômico, por sorte não busquei mais uma vez em sala de aula como faria isso, do contrário provavelmente viraria uma marxista ou outra motivo de piada qualquer, foi em discussões com amigos, leituras, filmes, documentários, meditação, passeios na floresta da tijuca... Aprendi que o sistema econômico moderno, o capitalismo, depredou, mas antes dele, já depredávamos, e até mesmo as correntes alternativas a ele, como o comunismo Russo, por exemplo, foi um dos sistemas que mais depredou o meio ambiente, em nome da nação, da guerra, e outras coisas que eu não peguei porque matei aula aquele dia. Eu tinha 19 anos e descobri a Anti-Civilização, Zerzan, Quinn, Sahlins... Uma corrente que afirma que não haverá solução enquanto não retornarmos para a natureza, para uma vida em cosonancea com o mundo natural e com o homem natural. Mas ai eu aprendi, e dessa vez eu nem mesmo escola tinha mais para ir, foi em passeios na pedra branca, foi em meditação, sonhando, em leituras que eu questionei, se antes era tudo muito bom, porque então criamos toda a civilização com todo seu tipo de merda? alguma coisa havia de errado com o homem, no que ele tocasse, iria dar errado, não importando aonde fosse, pouco importava o seu ambiente, ou sistema econômico. Foi então que eu conheci, o Tao Te Ching e o Bhagavat-gita, eu tinha 20 anos, o mundo é uma merda, eu estava na faculdade, e eu nem mesmo queria mais salvar o mundo, queria destruí-lo. Passado essa fase, eu fiz 21 anos, e descobri que até mesmo na merda, há coisas boas, e bonitas, coisas valiosas, que vale a pena lutar, são as boas ações das pessoas, nem sempre fazemos elas, mas quando escolhemos fazer, mudamos o mundo, percebi que a solução não era única, mas era cada coisa que podemos fazer de melhor.

Mas se precisar destruir o mundo, eu ainda to nessa vibe!

domingo, 28 de agosto de 2011

Tributo a falta de ar prolongada


Eu estou definhando, mas não é por comida.
Como no inverno, quando o Sol não esquenta.
Como no verão, quando o gelo não se forma.
Como no outono, quando as folhas não se sustentam.
Como na primavera, quando a vida se renova.
Quando sentimos fome, mas não é por comida...
Quando a saudade não é mais percebida.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Você é todo um erro psicossocial

Seu nome é só uma palavra que te designa.
Seu corpo é só uma matéria que te ilustra.
Sua idade é só um numero que te mata.
Sua percepção é só uma sensação que te engana.
Seus pensamentos só são uma resposta aos seus estímulos.

Seu nome é só aquele que se diz você.
Seu corpo é só aquilo que se passa por você.
Sua idade é só o quanto você foi roubado.
Sua percepção foi só aquilo que você perdeu.
Seus pensamentos são só o cúmplice dos teus atos.

O que te designa são só os graus acadêmicos que você põe antes do nome.
O que te ilustra são só os adereços que você põe em seu corpo.
O que te mata só são suas idéias.
O que te engana é só o que você quer.
O que te estimula é só o que você gosta.

Os seus prefixos são só o que você tem a oferecer.
Os teus adereços são só o que você tem para mostrar.
As suas idéias são só as influencias que você sofreu.
O que você quer é só aquilo que você não precisa.
O que você gosta é só aquilo que te entorpece.

Quem é você afinal?

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Abra os olhos.

Porque então você me deu a chance de ver o futuro?
Se já vejo o futuro se consolidando, como poderei mudá-lo?
Ver como será, mostra a minha impotência em mudar o futuro?
Ou minha incapacidade de mudar o presente?
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Porque somente essas duas opções? - respondeu brevemente.
Eu acrescentaria também sua incapacidade de ser responsabilizar pelos seus atos.
Porque não?